26 de mai. de 2011

Solução biológica contra dengue

Cientistas estudam como uma bactéria torna mosquitos imunes ao vírus que contamina 50 milhões de pessoas anualmente

Juliana Marques

Ela se multiplica com rapidez pelas células dos insetos e não admite concorrência. Uma das novas promessas para frear a transmissão da dengue em artrópodes - como o vilão Aedes aegypti - é a bactéria do gênero Wolbachia, um organismo unicelular poderoso, capaz de controlar populações inteiras de mosquitos ao impedir a contaminação do vírus. É o que afirma um estudo promissor da Universidade de Queensland na Austrália, em parceria com o Centro de Pesquisa René Rachou (CPqRR), da Fiocruz em Belo Horizonte.

Um dos autores do trabalho, o engenheiro agrônomo do CPqRR, Luciano Moreira, explica que os danos causados pela bactéria nos tecidos dos insetos são tão agressivos que mudam o comportamento dos artrópodes, especialmente dos animais adultos, que passam a viver menos. “Verificamos que alguns grupos de Wolbachia infectam especialmente as fêmeas dos mosquitos, que já passam a eclodir ovos contaminados. Mas espécies como Aedes aegypti e Anopheles spp não carregam naturalmente a bactéria. O desafio, portanto, foi injetá-la no tórax dos insetos em laboratório e observar se ela passaria a ser transmitida para outros mosquitos da espécie”, contou.

Um dos responsáveis pela pesquisa na Austrália, o engenheiro agrônomo da Fiocruz em Belo Horizonte, Luciano Moreira, afirma que uma equipe já busca financiamento para executar estudos com a Wolbachia no Brasil (Foto: Gutemberg Brito)
 Nos experimentos realizados com um dos gêneros da Wolbachia, a Wolbachia pipientis (ou Wmelpop) foi a mais agressiva, e ocasionou comportamentos surpreendentes nos mosquitos. “Ela se multiplicou nas células com bastante rapidez. Realizamos os testes com mosquitos de 35 dias - idade em que as fêmeas se alimentam de sangue humano para maturar os ovos. Os insetos contaminados com a Wmelpop não conseguiam se alimentar: eles pousava na mão do voluntário, mas não conseguiam introduzir a tromba e sugar o sangue”, explicou. Abaixo, o vídeo feito pelo grupo de pesquisadores mostra a dificuldade do inseto para se alimentar e acaba morrendo por inanição.



Posteriormente os cientistas montaram gaiolas especiais para os mosquitos se reproduzirem em cativeiro com temperatura ambiente e umidade ideal. Assim, eles puderam verificar que as bactérias também se multiplicaram e continuaram nas células dos mosquitos nas gerações seguintes. O próximo desafio foi soltar os Aedes com Wolbachias em um vilarejo local e verificar se os mosquitos selvagens também passariam a carregar a bactéria. “Verificamos que 10 semanas depois, 100% da população de mosquitos já apresentava a Wmel em suas células. No entanto, ainda não é possível medir se as bactérias poderão eliminar o arbovírus da dengue de forma efetiva, já a região não é endêmica da doença”, afirmou Moreira.

Na foto A, o mosquito saudável suga com facilidade o sangue do voluntário. Já o mosquito B, contaminado com as Wolbachias, não consegue se alimentar e morre por inanição (Foto: Luciano Moreira)

Para comprovar a eficácia da bactéria, portanto, a equipe realizará os próximos testes em países como Vietnã e Tailândia, onde a dengue deixa a população em alerta. O pesquisador comentou ainda que já existem planos de trazer o estudo para laboratórios brasileiros, no Rio de Janeiro: “No entanto serão necessários muitos estudos, já que as regiões são bastante diferentes, bem como o comportamento dos mosquitos. Por isso é preciso ter cautela antes de introduzir a Wolbachia nos Aedes brasileiros”.

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Saiba mais sobre o projeto contra a dengue na Austrália (em inglês)